O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu nesta terça-feira (25) que o porte de maconha para uso pessoal não é crime. O entendimento da Corte se choca com o do Congresso Nacional, onde tramita uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) no sentido contrário. A “PEC das Drogas”, aprovada no Senado e prestes a entrar na pauta da Câmara, criminaliza a posse e o porte de entorpecentes “independentemente da quantidade”.
A PEC das Drogas ganhou tração no Senado à medida em que avançava o julgamento no STF. O texto é de autoria do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que manifestou insatisfação com o entendimento dos magistrados. Segundo o senador, o Supremo está “invadindo a competência legislativa que é própria do Congresso”.
A decisão sobre o porte de maconha não é a primeira a contrapor os poderes Judiciário e Legislativo. Enquanto o Congresso aprovou o fim das “saidinhas” com ampla margem de votos, uma ação em pauta no Supremo pode restituir o benefício aos detentos. É o que ocorreu com o marco temporal, aprovado pelo Congresso mas, por enquanto, com a vigência suspensa pela Corte. Também há uma ação no Supremo que, se julgada procedente, pode flexibilizar a legislação relativa ao aborto.
Aborto – Neste mês, a Câmara aprovou um requerimento de urgência para um projeto de lei que estende as restrições ao aborto legal no País. Pela legislação atual, o aborto é permitido em casos de gravidez resultante de estupro, malformação fetal, como anencefalia, ou perigo de morte à gestante. Nestas circunstâncias, não há prazo para que o procedimento seja requerido. Com a proposta em tramitação na Câmara, a solicitação do aborto deverá ser feita em até 22 semanas de gestação. Do contrário, o procedimento acarretará em pena equivalente ao crime de homicídio simples, de seis a vinte anos de reclusão. Com a repercussão negativa, os autores afirmaram que “revisarão” a proposta e o texto, por ora, saiu da pauta.
Por outro lado, no STF, há um julgamento pronto para ser pautado que pode descriminalizar o aborto. Trata-se de um pedido do PSOL para que sejam revogados do Código Penal os artigos sobre o “autoaborto”, ou seja, quando a gestante induz o procedimento em si mesma.
O ofício em debate é uma Arguição de Descumprimento de Direito Fundamental (ADPF), um dispositivo com o qual se questiona se uma lei anterior à Constituição Federal, de 1988, é compatível com as normas constitucionais. A lei do Código Penal, que restringe o aborto, é de 1940.
Fim das ‘saidinhas’ – No fim de maio, o Congresso derrubou os vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao projeto de lei que restringiu as saídas temporárias dos presos do regime semiaberto, as chamadas “saidinhas”.
Pena Justa prevê melhorias no tratamento de presos no Brasil. Foto: Luiz Silveira/Agência CNJ
A tramitação contou com margem confortável nas duas Casas: entre os 81 senadores, foram 62 votos a favor, dois contra e um abstenção; na Câmara, a aprovação ocorreu em votação simbólica, com o apoio de todos os partidos.
Após a promulgação da lei, o texto se tornou alvo de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI). Este tipo de ação é uma consulta ao STF para avaliar se uma determinada legislação fere um princípio garantido pela Constituição.
O pedido é da Associação Nacional da Advocacia Criminal (Anacrim) e foi submetido diretamente ao plenário do Supremo por determinação do relator Edson Fachin, o que pode acelerar o julgamento do caso.
Marco temporal – A Lei do Marco Temporal foi aprovada pelo Congresso, mas, por ora, está com a vigência suspensa. O marco temporal é uma interpretação de um artigo da Constituição Federal. Esse entendimento prevê que uma terra indígena só pode ser demarcada com a comprovação de que os povos originários estavam no local requerido na data de promulgação da Constituição, ou seja, no dia 5 de outubro de 1988.
A Câmara aprovou o marco temporal em maio de 2023. Em setembro, o STF derrubou a tese e invalidou o argumento da linha de corte temporal. Mesmo assim, seis dias depois da decisão da Suprema Corte, o texto foi aprovado no Senado. Ao sancionar a lei, em outubro, Lula vetou o trecho que causaria o impasse jurídico, mas o Congresso derrubou o veto em dezembro.
Em abril, o ministro do STF Gilmar Mendes, suspendeu todos os processos judiciais – em todas as instâncias do Judiciário – que tratem da Lei do Marco Temporal.
‘Contraofensiva’ do Congresso – Além dos temas que contrapõem decisões do Legislativo e do Judiciário, é motivo de embate o próprio escopo de atuação do Supremo, ou seja, em quais situações os ministros da Corte podem ou não agir. O Congresso prepara um “pacotão” de medidas que, se aprovadas pelas Casas, limitarão as prerrogativas dos magistrados do STF.
É o caso de uma proposta que exige autorização do Legislativo para medidas judiciais contra parlamentares em exercício, como inquéritos e ordens de busca e apreensão da Polícia Federal (PF). A proposta do deputado federal Rodrigo Valadares (União Brasil-SE) diz que só poderão ser deflagradas operações sem este aval nos crimes de “flagrante delito”.
Além disso, em novembro de 2023, prestes a entrar em recesso, o Senado aprovou uma PEC que limita o poder de decisões monocráticas de ministros do STF. O texto, por enquanto, não foi pautado na Câmara.
Por fim, a delimitação de mandatos para magistrados do Supremo também é debatida pelos congressistas. Rodrigo Pacheco é entusiasta do tema, ao qual já qualificou como “apropriado” para entrar em discussão. Pela norma atual, o ministro do STF permanece no cargo até 75 anos, quando a aposentadoria é compulsória.
Editado por Roberta Cáceres, com informações de Uol Notícias